Pode parecer estranho, mas Yossêf é o único personagem bíblico a ser chamado de haTsadíc (o justo) pelos sábios do Talmud, apesar de a própria Torá descrevê-lo como egocêntrico, fofoqueiro e bajulador.

E mesmo após tantos anos no Egito, ao reencontrar seus irmãos, ele demonstra ser presunçoso, arrogante e vingativo, como vemos em Mikêts e Vaigásh.

Em sua vingança, Yossêf até mesmo envolve seu irmão mais novo, Biniamin, que nem mesmo teve participação na trama que os irmãos mais velhos haviam armado para ele no passado.

Ele vê que seus irmãos já não são mais os mesmos e não agem mais como agiram no passado, pois se negam a entregar o filho mais novo de Yaacóv. Ele vê, mas não enxerga.

Os irmãos afirmam “nosso pai é idoso e já perdeu um filho caçula, não podemos privá-lo da presença de seu outro filho mais novo”. Yossêf ouve, mas não escuta. E exige que lhe seja trazido Biniamin.

Quando Biniamin é trazido, Yossêf os recebe com festa, mas, após dispensá-los, manda a guarda atrás deles, acusando-os de roubo. Mochilas revistadas e um copo de prata, plantado ali de maneira vil, é encontrado com Biniamin.

Diante da prisão de Biniamin, Yehudá se oferece para ficar em seu lugar, implorando que o menino possa voltar para Yaacóv, pois a dor da perda poderia leva-lo à morte. Yossêf permanece impassível.

Ele continua sem enxergar, continua sem escutar. Só na terceira vez, quando Yehudá se aproxima e fala a seu ouvido sobre Yaacóv, é que ele finalmente desiste da vingança, revela-se aos irmãos e pergunta: “Meu pai ainda vive?”. Yossêf, até então cego e surdo pelo desejo de vingança, ainda não tinha se dado conta daquilo que os irmãos já haviam falado.

É nesse momento que ele consegue passar sobre o passado, libertar-se do ódio que nutria pelos irmãos, desistir de sua vingança e enxergar de maneira positiva o que o destino acabou lhe reservando. Ali, Yossêf muda sua própria natureza.

É somente ao esmagar a arrogância e o egoísmo dentro de si, ao sufocar seu próprio desejo de vingança é que ele se torna capaz de enxergar o outro em sua completude, em sua humanidade e em seu potencial de mudança.

Ali ele se torna o tsadíc. “O que tudo isso significa?” – pergunta Elie Wiesel – “Significa que ninguém nasce tsadíc. Significa que se deve lutar para se tornar um justo. E, uma vez tendo se tornado um tsadíc, deve-se lutar para não deixar de sê-lo”.

Shabat Shalom

Moré Theo Hotz